Splash and Go! – A vingança deve ser julgada como consequência

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Os pilotos Valentino Rossi e Matt Kenseth valeram-se de um sentimento legítimo

rossi x kenseth 2

Duas das maiores categorias do esporte a motor foram palco de manobras que renderam intermináveis discussões nos últimos dias: MotoGP com Rossi x Márquez e a Nascar com Kenseth x Logano.

Sou repórter de uma rádio popular. Saio de casa sem saber qual será o assunto da minha pauta do dia. Posso noticiar uma  denúncia contra um órgão público, como também posso entrevistar o cantor sertanejo mais badalado do momento, mesmo que eu nunca tenha ouvido falar dele antes. No segundo caso, infelizmente, é uma tarefa bem difícil fazer uma entrevista realmente interessante, pois quando não há o domínio do assunto, é melhor ir no óbvio.

Foi isso que percebi em grande parte da cobertura dos dois incidentes, principalmente no que envolveu os pilotos da MotoGP: colegas de profissão que não acompanharam a temporada ou que pouco conhecem as carreiras dos envolvidos.

O primeiro artista que entrevistei foi o cantor Pedro Mariano. Como acompanho a carreira dele há bastante tempo, pude conduzir uma entrevista de 15 minutos sem citar Elis Regina, Maria Rita ou César Camargo Mariano. Não dá para julgar pilotos como Valentino Rossi e Marc Márquez por um fim de semana.

Em uma noite de domingo, no início de 2012, eu estava voltando para casa, quando parei em um cruzamento e fui abalroado por táxi (leia-se veículo conduzido por um profissional do trânsito). Desci do carro e fui avaliar o estrago. O taxista não saiu do carro, por mais que o seu veículo estivesse com a dianteira bem avariada. Caminhei calmamente até o seu veículo, que estava a cerca de 5 metros de distância do meu. Foi nesse momento que ele percebeu a oportunidade de agir como um canalha: acelerou e fugiu.

Voltei para o meu carro correndo, possuído pelo ódio, mas não por causa da batida, que é algo completamente aceitável quando você coloca o carro na rua. Fui atrás do táxi e após menos de um quilômetro, eu já estava colado na traseira dele. É claro que o primeiro pensamento que passou pela minha cabeça foi “vou transformar o Voyage dele em um Gol”, mas lembrei que o meu carro não era tão seguro quanto um carro da Nascar, e também que se aumentasse a avaria do carro, sentiria o prejuízo no bolso, ao contrário do que acontece com um piloto de uma grande categoria.

Me arrependo de não ter feito? Não. Será que eu me arrependeria hoje, caso tivesse feito? Provavelmente, também não. Preferi anotar a placa do táxi e procurar a autoridade policial. O taxista me enrolou durante meses, contando as histórias mais tristes possíveis. Foi então que percebi que ele era pobre, mas de espírito. E essa é a pior pobreza que pode afligir um ser humano. Deixei pra lá e fiquei com o prejuízo.

Valentino Rossi é o maior piloto da história da MotoGP. Marc Márquez apareceu como um fenômeno, indicado como sucessor de Rossi. O script dessa história foi perfeito em 2013 e 2014. Com a aposentadoria prematura do incrível Casey Stoner, Márquez reinou com a Honda, enquanto Rossi enfrentava dificuldades na readaptação com a Yamaha, principalmente porque o seu companheiro de equipe é o talentoso Jorge Lorenzo.

Mas em 2015, o destino resolveu pregar uma peça em todos. Valentino Rossi, aos 36 anos, voltou a pilotar como no auge da carreira. Já o jovem Marc Márquez, de apenas 22 anos, não deu conta da moto no início da temporada, caindo algumas vezes. Jorge Lorenzo correu por fora. Sem participar de grandes batalhas na pista, Lorenzo conseguiu manter-se na segunda colocação durante todo o campeonato.

Márquez demonstrava grande admiração por Rossi. Imaginem o que passava na cabeça de um jovem de 20 anos, quando ele foi capaz de derrotar o ídolo, o que lhe conferiu o posto de sucessor de Rossi. Mas Rossi não é um piloto comum, ele é um mito dos esportes a motor. Basta procurar os resultados de quando ele testou carros da Fórmula 1, DTM e rally para entender o que estou falando. Outro piloto, que merece ser considerado um mito, é o também italiano Alessandro Zanardi. Falarei sobre Zanardi em uma ocasião mais propícia.

Para Márquez, ter a ascensão meteórica interrompida em 2015, já era algo muito ruim. Tendo o Rossi como algoz seria ainda pior. Da mesma forma que o Alonso aposentou o Schumacher pela primeira vez, tudo caminhava para Márquez aposentar Rossi em breve.

Márquez tem 3 rivais diretos: o companheiro de equipe, Dani Pedrosa, que tem o mesmo equipamento; Valentino Rossi, o maior de todos os tempos e Jorge Lorenzo, bicampeão mundial, mas que não foi o melhor de sua geração, que teve Casey Stoner como o grande nome.

Para o novo fenômeno, já que não deu disputar o título, a vitória de Lorenzo seria a opção que menos ofuscaria a sua trajetória. De Valentino, ele foi considerado o sucessor. Já Dani Pedrosa, tenta, sem sucesso, ser campeão na categoria principal do motociclismo mundial desde 2006, algo que já foi alcançado por três companheiros de equipe dele neste período.

Márquez tentou, de todas as formas, impedir o triunfo de Rossi, já que está acostumado a pilotar com a faca nos dentes desde as categorias de acesso. Não foram raras às vezes em que ele forçou ultrapassagens, batendo a carenagem na moto nos rivais. É um grande piloto, que consegue fazer uma prova inteira no limite, arriscando tudo a cada curva. É bonito de ver.

É uma pena que ele tenha escolhido se meter em uma disputa, da qual não teve capacidade de participar. Ele atrapalhou o Rossi, sim. Não acredito em questões patrióticas, pelo fato de Lorenzo também ser espanhol. Márquez sabia que um título de Valentino poderia representar o início de um novo domínio, em todos os sentidos, do italiano na MotoGP. Caso isso acontecesse, quem se interessaria pelo novo Valentino se o original ainda é o melhor da atualidade?

Na Fórmula 1, Lewis Hamilton não esconde a idolatria por Ayrton Senna. Porém, 13 anos separam a morte de Senna e a estreia de Hamilton na categoria. Nunca saberemos qual seria a postura do piloto inglês, caso tivesse a oportunidade de superar na pista o seu maior ídolo.

Rossi teve motivos para querer vingança e a fez. Pagou um preço alto, perdeu o título numa corrida em que provou porque é o maior de todos os tempos. Jorge Lorenzo, que é um ótimo piloto, ‘apenas’ ganhou mais um título.

E por favor, não comparem a atitude de Rossi com a do Senna em 1990 e nem com as de Schumacher em 1994 e 1997. Pois ao contrário destes grandes campeões da Fórmula 1, Rossi não tirou da prova o seu rival pelo título.

Na Nascar, nas últimas 10 etapas da temporada, os 16 pilotos mais bem colocados no campeonato disputam o Chase, que é um formato de playoff. O Chase é dividido em etapas, de três em três corridas, eliminando sempre os quatro piores classificados. Quando um piloto vence uma corrida, ele já está classificado para a próxima fase, independente do resultado nas outras duas provas da etapa.

O piloto Joey Logano venceu a primeira corrida da segunda etapa do Chase, realizada em Charlotte, garantido assim uma vaga para a terceira fase da disputa pelo título. Na corrida seguinte, em Kansas, o piloto Matt Kenseth liderou o maior número de voltas. Kenseth precisava da vitória para avançar a terceira fase do Chase. Enquanto isso, Logano, o único piloto com vaga garantida na disputa da próxima etapa, corria em uma ótima segunda colocação. Na parte final da prova, Logano não se satisfez com a segunda colocação e partiu pra cima de Kenseth, que tentou fechar a porta para o rival de todas as formas. Mas Logano foi ambicioso demais e acabou tocando o carro de Kenseth, que rodou na pista. Kenseth ainda conseguiu terminar a prova na 14ª colocação.

Com o resultado, as chances da presença de Kenseth na etapa seguinte do Chase foram reduzidas. Mas essa história não teria um ponto final em Kansas. Logano também venceu a terceira corrida da segunda etapa da Chase, realizada em Talladega. O piloto começou a terceira fase do Chase liderando a prova em Martinsville. Mas Logano não contava com o velho ditado ‘quem bate esquece, quem apanha jamais’.

Kenseth, já fora da disputa pelo título, se envolveu em um acidente com Brad Keselowski, companheiro de Logano na equipe Penske. Kenseth teve que levar o carro para o box da equipe. Como é comum na Nascar, ele voltou à pista várias voltas atrás do líder Joey Logano, com o carro todo remendado, faltando partes da carroceria. Kenseth sabia que não tinha mais a menor chance na corrida, mas um desejo ainda permanecia vivo.

Na primeira oportunidade, Kenseth simulou uma perda de controle por um pneu furado e atingiu a traseira do carro de Logano. Os dois abandonaram a prova e o público presente no autódromo aplaudiu Kenseth de pé. No entanto, a direção da Nascar não gostou muito e suspendeu Kenseth por duas corridas.

Faltam duas corridas para o fim da temporada da Nascar. Só resta a Joey Logano vencer a próxima corrida, em Phoenix, para garantir uma vaga entre os quatro pilotos que disputarão o título, no dia 22 de novembro, na pista de Homestead.

Toda vingança tem uma motivação, mas na minha opinião, a de Rossi e Kenseth foram legítimas.

Trilha sonora desta publicação: Titãs – Filantrópico

Até!

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