Por João Brigato, de Porto Feliz (SP)
Ter um SUV requer abrir mão de algo. A categoria da moda — e única a crescer em participação e volume nos últimos cinco anos — hoje é inundada de concorrentes com atributos diferentes. Em geral, é preciso abrir mão do espaço interno farto que as minivans têm, esquecer do acabamento refinado dos sedãs com preço próximo ou da esportividade dos hatches.
Chegar tarde nesta briga fez bem para a Nissan, que teve a oportunidade de atacar justamente onde seus concorrentes erraram. O Kicks não é apertado como um Ford EcoSport, não é preguiçoso como um Jeep Renegade, não tem um CVT chato e abusa no preço como o Honda HR-V, nem é simplório como um Renault Duster. Em suma, os pecados dos rivais são as glórias do Nissan Kicks.
Figurão da TV
Já vimos o Kicks algumas vezes, seja nas ruas, acompanhando os condutores da tocha olímpica e na TV, por isso, seu estilo já não é novidade. Mesmo tendo medidas semelhantes às do Honda HR-V (no Kicks ão 4,29 m de comprimento, 1,76 m de largura, 1,59 m de altura e entre-eixos de 2,61 m) o Nissan parece mais esbelto e atlético, devido aos para-lamas musculosos e dos vincos pronunciados da carroceria. O V cromado da grade frontal se estende por linhas no capô e vai até o teto, que parece flutuar. A traseira volumosa tem inspiração nas “traseiras” brasileiras, combinando com as chamativas lanternas estilo bumerangue já vistas em outros SUVs da marca. Bom é que o porta-malas ficou com capacidade de 432 L.
Usando uma versão aperfeiçoada da plataforma V (mesma de March e Versa) com novo conjunto de suspensão e aços mais resistentes, o Kicks herda do Versa o farto espaço interno. A plataforma permitiu boa área para as pernas dos passageiros traseiros e amplitude para quem anda na frente, principalmente no espaço para a cabeça. Acabamento em couro na porção central e estilo refinado disfarçam os plásticos simples em boa parte das portas e do painel.
O aspecto moderno da cabine está de acordo com a tecnologia embarcada. Uma tela TFT de alta resolução com sete polegadas faz as vezes de conta-giros e assume outras 12 funções ligadas ao computador de bordo. A central multimídia de 7 polegadas é uma evolução da usada no Sentra: rápida, fácil de usar e com um bom GPS, mas sem Android Auto ou Apple CarPlay — que, por enquanto, nenhum concorrente tem. E ah, o volante novo veio do GT-R.
O belo volante de três raios e base reta deixa claro que o Kicks não é apenas um March com roupa de SUV, como muitos pensavam. O motor 1.6 16V tem calibração exclusiva para o SUV compacto, além de novo duto de admissão que, segundo a Nissan, fazem os 15,5 kgfm de torque chegar mais cedo, a 4.000rpm. A potência subiu para 114 cv a 5.600rpm. Na prática, o Kicks parece ter um motor maior. Pode ser culpa do peso total, de bons 1.142 kg.
A nova geração da transmissão CVT, evolução da usada em March e Versa há apenas mês, contribui para isso. Além de ser mais rápida e silenciosa, a transmissão simula trocas de marcha com eficiência. Bem, quando se lembra de fazer isso. Em algumas acelerações fortes o instinto natural dos CVT, de ter trabalhar em rotação alta intermitente, tem poder maior e a transmissão esquece de simular trocas. Apesar disso, as retomadas são rápidas para um carro aspirado.
SUV bom de curva
Em geral, a dinâmica dos SUV é sacrificada pela carroceria alta e suspensão elevada. Mesmo não sendo tão afiado quanto um hatch médio, o Kicks contorna curvas com destreza. A carroceria pouco torce e a suspensão que vive um meio termo entre firmeza e conforto mantém tudo no lugar. Absorve bem os impactos causados por buracos emitindo um som abafado que diminui o peso na consciência pela barbeiragem.
O bom comportamento em curvas também é atribuído à direção elétrica – firme na medida certa – e ao controle dinâmico de chassi. O sistema poderia parecer uma tecnologia para impressionar leigos e que pouco faria diferença para o motorista, mas não é assim. Aplicando pressão nos freios de forma independente em cada roda, o controle consegue diminuir sensivelmente as oscilações da carroceria mesmo em altas velocidades.
Novo líder vem aí?
A Nissan criou expectativa com o Kicks e entregou um SUV que não te obriga a abrir mão do melhor de outras categorias: conjunto mecânico convincente, visual diferentão (sem ser barroco) e prazer ao dirigir. O Honda HR-V, pela primeira vez, tem uma real ameaça ao seu reinado.
Mas o Honda não precisa se preocipar tão de imediato. Inicialmente, o Kicks será importado do México apenas na versão SL (esqueça da série especial Rio 2016: as mil unidades já foram vendidas). Só no ano que vem, quando for nacionalizado, terá outras versões mais em conta que, aí sim, permitirão ao Kicks alcançar o topo de ranking de vendas do segmento.
Em tempo, o Nissan Kicks SL vem com ar-condicionado digital, controle de tração e estabilidade, seis airbags, sensor crepuscular, bancos de couro e um utilíssimo sistema de câmeras 360º, custando R$ 89.990. É mais barato que HR-V EXL e Renegade Limited Edition, mas o valor também envolve um sacrifício. Do que você precisará abrir mão no Kicks? Controle de cruzeiro, pois isso ele não tem…
As vendas começam em 5 de agosto e quem quiser poderá recorrer a alguns opcionais: pintura metálica por R$ 1.500, ou R$ 2.500 se o teto for laranja, e mais R$ 500 por couro marrom ou bege nos bancos, painel e portas.
Dados da fabricante
Motor Quatro cilindros em linha, dianteiro, transversal, flex; Cilindrada 1598 cm³; Potência 114 cv a 5.600 rpm com etanol e gasolina; Torque 15,5 kgfm a 4.000 rpm com etanol e gasolina; Câmbio automático do tipo CVT; Tração dianteira
Dimensões: 4,29 m; Largura 1,76 m; Altura 1,59 m; Entre-eixos 2,61 m; Porta -malas 432 l; Peso 1.142 kg.
Aceleração de zero a 100 km/h: 12 segundos com etanol
Velocidade máxima: 175 km/h com etanol
Consumo Cidade em km/l (Inmetro): 8,1 (Etanol) / 11,4 (Gasolina)
Consumo Estrada em km/l (Inmetro): 9,6 (Etanol) / 13,7 (Gasolina)
Origem: Aguascalientes, México