Por Bird Clemente
Piloto de competição brasileiro de 1957 a 1973
Em 1956, foram instaladas as primeiras fábricas de automóveis no Brasil, como a Indústrias Romi, de Santa Bárbara d’Oeste, fabricando o Romi-Isetta, um minicarro italiano, e a Vemag S.A. Veículos e Máquinas Agrícolas, em São Paulo, iniciando a produção do DKW alemão. Nesta mesma época o Wilson Fittipaldi se une ao presidente do Centauro Motor Clube, Elói Gogliano, e eles realizam a primeira edição da Mil Milhas Brasileiras, no Autódromo de Interlagos, dispondo recursos da indústria de autopeças que contribuía com inéditos e valiosos prêmios, além de fornecer gratuitamente seus produtos para os concorrentes. Era uma nova fase do automobilismo, e a indústria automobilística a partir daí, e ao longo do tempo, perceberia o interesse do público, elegendo as pistas e em especial a Mil Milhas como importante vitrine para promover as vendas e desenvolver a qualidade de seus produtos. Em 1960, a Vemag foi a primeira fabricante a montar um departamento de competição no Brasil. Jorge Lettry é nomeado o primeiro chefe de equipe oficial, e convoca-me, junto com Mário César de Camargo Filho, como seus pilotos, para disputar a temporada. Com o resultado positivo do empreendimento, outras fabricantes que vieram logo depois seguiram o bom exemplo e passaram a participar também das competições. A Simca do Brasil com o Simca Chambord, a Fábrica Nacional de Motores com o FNM 2000 JK, a versão nacional do italiano Alfa Romeo 2000 sedã, e a Willys-Overland do Brasil — fundada em abril de 1952, mas só começando a fabricar o Jeep em 1958 — com o Renault Gordini e o Interlagos berlineta, por meio de suas equipes de competição, promoviam intensas e interessantes disputas nas pistas.
O automobilismo brasileiro seguiu neste formato e ao longo do tempo praticamente todas as fábricas montaram seu departamento de competição, que resultou na seleção por competência, surgindo nesta época a primeira safra de pilotos de carreira, que na próxima década, a de 1970, iriam brilhar no automobilismo internacional. Os amantes do automobilismo, os jornalistas e os historiadores constataram a destacada importância da Equipe Willys na história do automóvel e do automobilismo brasileiro. Resposta positiva de um planejamento ousado com altos investimentos, a Willys formou uma equipe de técnicos, mecânicos e pilotos muito forte, dispondo da parceria da Renault francesa por intermédio de Jean Rédélé, fabricante e preparador dos Alpines baseados em mecânica Renault que tanto sucesso faziam nas competições europeias.
Na década de 1950, quando surgia aqui a primeira fábrica de automóveis, o Brasil era um país ainda subdesenvolvido, mas com o futuro promissor, especialmente como produtor agrícola. Quem poderia imaginar que seriamos um dos maiores mercados do mundo! Nestas circunstâncias, foi inaugurada em 1958 a fábrica da Willys-Overland do Brasil, no bairro do Taboão, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, começando pela fabricação do Jeep CJ-5 e, no ano seguinte, o Renault Dauphine, em razão da participação da Régie Nationale des Usines Renault na Willys brasileira com 15% das ações. Antes de ter a fábrica de São Bernardo do Campo a Willys já montava, em regime de importação completamente desmontados (CKD), o Jeep e a caminhoneta Rural, que eram os utilitários ideais para o nosso desenvolvimento pelo fato de as nossas estradas naquela época serem quase todas de terra. Inclusive havia estados praticamente inexplorados e os ruralistas necessitavam dos veículos com tração nas quatro rodas. Não havia dificuldades na comercialização destes utilitários que eram tão necessários para o país e o mercado era próspero. O fato é que Willys havia visto grande potencial no mercado de carros populares, daí o acordo com a Renault, a estatal francesa, para produzir aqui a linha Dauphine, lançada havia apenas dois anos na Europa e que já era grande sucesso por lá. A Renault tinha tradição esportiva e havia versões interessantes na nova linha, como o Renault Dauphine Gordini e o Renault 1093, esta bem apimentada. O presidente da Willys-Overland do Brasil era o americano William Max Pearce, que havia lutado na Segunda Guerra Mundial, no teatro do Pacífico, como piloto de caça da Marinha americana. Era um executivo de ideias avançadas, assim como a diretoria da empresa, composta de brasileiros e americanos, estes geralmente bastante liberais e que combinavam bastante com os brasileiros, com o nosso jeito, e se harmonizavam com as aspirações, amor e vocação que os brasileiros têm por carros esporte e automobilismo. Assim, os Renault caíram como uma luva nos planos da empresa. Por isso, com este clima tão favorável, foi fácil criar e desenvolver o Departamento de Competição da Willys.
O presidente, assessorado e influenciado pelo jornalista especializado em veículos e em vias de tornar publicitário, Mauro Salles. tornou tudo bastante simples. Dentro dessa tradição, a fábrica se unia à Alpine, uma pequena fabricante de carros esporte da França, que forneceria know-how, peças e serviços para o Departamento de Competição. Um desses Alpines era o A-108, cuja carroceria era feita de um material ainda novidade na indústria automobilística brasileira, o compósito de plástico reforçado com fibra de vidro, que naquele tempo era mais conhecido pelo seu nome comercial, Fiberglas, marca registrada da Owens Corning. O Alpine A-108 existia em três versões de carroceria: conversível, cupê e berlineta. Esta era muito atraente, com linhas fluidas e elegantes criadas pelo carroziere Giovanni Michelotti. Como já havia os laços com a Renault, a Willys decidiu entrar no novo segmento que despontava no Brasil, o dos carros esporte, com o Alpine se mostrando ideal. Seu lançamento foi o grande destaque do II Salão do Automóvel de São Paulo, em 1961. No estande da Willys, porém, além dos Dauphines expostos havia um carro assemelhado, com rodas diferentes e um visual mais luxuoso. Era o Renault Gordini (que aqui perdeu o nome do meio, Dauphine), a ser produzido logo no começo de 1962, simultaneamente, mas não no mesmo local, ao Interlagos.
Nesta época eu estava na Equipe Vemag e todos nós nos surpreendemos diante daquele maravilhoso e fantástico pequeno carro, baixo e de dois lugares, que seria nosso concorrente. Jorge Lettry, nosso chefe, foi quem mais ficou preocupado, profundo conhecedor que era de automobilismo e carros de corrida. Ele anteviu sérias dificuldades pela frente e o futuro mostraria que ele estava certo. O Alpine A-108 — aqui rebatizado Interlagos, nome sugerido pelo agora publicitário Mauro Salles, que já anunciava seus propósitos para o automobilismo brasileiro —, começou a ser fabricado num galpão no bairro paulistano do Brás, mas logo se mudou para Santo Amaro. Para dirigir a pequena fábrica foi contratado o piloto Christian Heins, que tinha outra missão, paralela: criar o Departamento de Competição e colocar o Gordini e o Interlagos na pista sob o manto de Equipe Willys. Para tanto foram preparados três Gordini, de números 40, 41 e 42 e três Interlagos berlineta, 12, 21 e 22, que foram pintados nas cores da bandeira brasileira, amarelo com uma larga faixa central verde. Inicialmente fizeram parte da equipe os pilotos Luiz Pereira Bueno, Danilo de Lemos, Eugênio Martins, Agnaldo de Góes, Rodolfo “Fofô” Olival Costa, Wilson Fittipaldi Júnior e o próprio Christian Heins, mais conhecido pelos amigos e fãs como “Bino”. Não faltavam recursos para que a cada corrida a equipe se apresentasse melhor, mas entre várias e tantas vitórias a mais importante foi a da 500 Milhas de Interlagos de 1962, quando o grande rival era um Porsche 1600 Super 90, pilotado pelos notáveis Chico Landi e Mário César de Camargo Filho, o “Marinho”. Foi um espetáculo de pilotagem que ficou inesquecível na história de Bino e dos Interlagos amarelo e verde. Seis meses depois ele foi escalado para pilotar um Alpine M63 em dupla com o piloto e jornalista automobilístico francês José Rosinsky na 24 Horas de Le Mans de 1963. Com uma hora de corrida ele liderava sua categoria e numa lombada sem visibilidade se deparou com um acidente, havia um carro atravessado no meio da pista. Ele desviou, mas acabou saindo do asfalto e colidindo contra uma árvore. Com o forte impacto houve um incêndio e, desse modo, perdia o Brasil o seu grande ídolo. Era sábado 15 de junho de 1963, um dia que nunca vou esquecer.
Quando eu soube da morte do Christian fiquei bastante abalado. Fui ao Frevinho, na Rua Oscar Freire quase rua Augusta, uma lanchonete que frequentávamos e que tinha uma pizza deliciosa. Chegando lá encontrei o Wilsinho, sentamos numa mesinha e pouco falamos. Compartilhamos aquela amargura e ficamos ali sentados, apenas vivendo a tristeza da perda do Bino. O Wilsinho o adorava, tanto que batizou o filho Christian em homenagem ao ídolo, e assim futuramente mais um Christian brilharia nas pistas do mundo. Com a morte do Bino, assumiu o Departamento de Competição da Willys o seu secretário e assessor Luiz Antônio Greco, que estaria fadado a ser uma das personalidades mais importantes do automobilismo brasileiro. Já foi sob o comando dele a convocação dos predestinados e fantásticos garotões Francisco “Chico” Lameirão, José Carlos Pace e Carol Figueiredo de uma tacada só. Já estavam na equipe Luiz Pereira Bueno e Wilson Fittipaldi Júnior, e Greco precisava de mais um piloto pronto e experiente para preencher a lacuna deixada pelo Bino, e seu desejo era articular minha transferência da também competitiva Equipe Vemag para a Equipe Willys, porém eu e o Marinho tínhamos benefícios, inclusive um carro de frota para nosso uso particular. Nestas circunstâncias, exercendo o seu poder e vocação de grande articulador, Greco viabiliza recursos junto à diretoria e me torna o primeiro piloto brasileiro a receber salário exclusivamente para pilotar carros de corrida. Pouco tempo depois o salário e benefícios eram estendidos a Wilson Fittipaldi Júnior e Luiz Pereira Bueno. Era o início de uma nova fase para os pilotos de carreira no Brasil.
Ver este filme voltar para trás não me é fácil. Participar na equipe oficial da Willys era um privilégio, fazíamos parte da elite dos pilotos daquela época. Nosso chefe Greco não queria nem saber, jogava um contra o outro para o desempenho melhorar sem se importar com o resto, num verdadeiro salve-se quem puder. Todos queriam nosso lugar, o de pilotos de Interlagos berlineta. No inicio nós éramos seis, mas nas tantas provas longas para guiar os seis carros da equipe era preciso mais seis pilotos, era a única oportunidade que os outros tinham de participar da nossa turma e desfrutar de privilégios e mordomia que nos cercavam. Cada um de nós tinha o seu jeito, o seu estilo naquele clima de enorme disputa interna. Não era fácil o autocontrole da vaidade, do egoísmo. Era o preço que tínhamos que pagar por aquele lugar privilegiado. A premiação de cada corrida era somada e dividida igualmente para todos os pilotos, sendo que 10% era destinado aos mecânicos. Pelo menos duas vezes por mês havia corrida e muitas eram provas longas, como Mil Milhas, 12 Horas, 24 Horas e a equipe colecionava vitórias, cumprindo o objetivo de promover a boa imagem e as vendas.
A atividade do Departamento de Competição da Willys era grande e o seu custo, alto. Sendo assim, em fim de semana que não tinha corrida fazíamos demonstrações nas cidades do interior do Brasil. Quatro carros da equipe, pilotados pelo Greco, Luiz Fernando Terra Schmidt, Luiz Pereira Bueno e eu, sendo dois Gordinis e duas berlinetas, simulávamos uma competição, geralmente na praça central da cidade, e em seguida o Luizinho e eu fazíamos uma exibição de piruetas e acrobacias. No final levávamos no banco do carona autoridades, clientes e convidados do revendedor que promovia o evento, que participava com a Willys nas despesas da produção, pois a festa era sobretudo dele. Nós chamávamos estes eventos carinhosamente de “Cirquinho da Equipe Willys”. O público era enorme, havia gente até em cima de árvores e telhados e os revendedores Willys disputavam a data para o evento. Naquela época as pavimentações no Brasil eram normalmente estradas de terra e ruas com calçamento de paralelepípedo, que exigiram muitas modificações no projeto do Gordini devido ao contraste com as condições da Europa, onde a linha foi um sucesso de vendas. Na sua categoria, o Gordini tinha alto desempenho, fazia mais de 15 quilômetros com um litro de gasolina e tinha quatro portas, acomodando quatro ou até cinco passageiros. Enquanto que a referência do mercado em termos de resistência era o nosso concorrente Volkswagen 1200, um “Jeep de luxo”, com menos conforto que o nosso Gordini, tínhamos que provar para o público que o nosso carro também era resistente. Mauro Salles então tirou um coelho da cartola. “Tive uma grande ideia para virar o jogo, vamos quebrar o recorde mundial de resistência.” — De quem é? — perguntei-lhe. — É do Ford Cortina inglês, pilotado pelos famosos Jim Clark (campeão mundial de F-1), Trevor Taylor, Tony Brooks e Ted Dougary, entre outros — respondeu. Este cara está louco, pensei…Mas as ideias do Mauro Salles e a disposição do Greco eram fora dos limites, os sonhos se materializavam e o projeto foi para frente.
A Willys asfaltou praticamente todo o anel externo de Interlagos, onde se realizaria o evento, construiu toda a infraestrutura necessária, escalou dez pilotos: Luiz Pereira Bueno, Chico Lameirão, Wilson Fittipaldi Júnior, Geraldo Meirelles Freire, José Carlos Pace, Carol Figueiredo, Danilo de Lemos, Wladimir Costa, o próprio Luiz Antônio Greco e eu. O teste foi supervisionado e oficializado pela FIA na pessoa de seu representante oficial, o Sr. Paul Pierre Michel Massonet, que permaneceu diuturnamente na pista. O carro em questão foi escolhido aleatoriamente pelo delegado da FIA na linha de montagem na fábrica e, diante dos jornalistas, todos os presentes assinaram a carroceria com um afiado estilete de aço. A tentativa de recorde iniciou-se no dia 26 de outubro de 1964 e rodamos ininterruptamente durante vinte e dois dias, completando 51.233 quilômetros à média global de 97 km/h, incluindo as paradas para controles e abastecimentos, inclusive o tempo perdido com uma capotagem. Foi um índice extraordinário, considerando que a velocidade máxima declarada do carro era de 116 km/h. Depois de analisado o desgaste das peças vitais do Gordini, chegou-se a conclusão que o veiculo tinha capacidade de quilometragem muito maior. O carro foi batizado “Teimoso”, que virou a marca do carro popular da Willys exclusivamente vendido e financiado pela Caixa Econômica Federal segundo um plano da área econômica do governo para revitalizar a produção da indústria automobilística.. Nesta fase em que ainda usávamos os Gordinis e os Interlagos nas competições, a conquista do Recorde Mundial de Resistência foi muito honrosa para a marca Renault, para a Equipe Willys, bem como para a jovem indústria do automóvel no Brasil.
Outro momento muito importante para a marca foi a vitória na 200 Milhas de El Pinar, em Montevidéu, no Uruguai, a primeira de uma equipe brasileira no exterior. Quem promovia a divulgação dos bons resultados da equipe, amplificando e popularizando a imagem dos pilotos, era a agência de publicidade de Mauro Salles, e entre os anúncios ficou histórico e inesquecível o de uma foto produzida em Interlagos com os carros, os pilotos e também Luiz Antônio Greco, nosso chefe. O texto dizia: “Estes homens maravilhosos e suas máquinas corredoras”, que foi publicado na página central de todas as principais revistas do país. A mensagem fora criada em paródia do famoso filme inglês “Estes homens maravilhosos e suas máquinas voadoras”, de 1965, e lá estão os seis pilotos efetivos daquela época: Luiz Pereira Bueno, Wilson Fittipaldi Júnior, Carol Figueiredo, José Carlos Pace, Chico Lameirão, nosso chefe Luiz Antônio Greco e eu. Logo depois Emerson Fittipaldi completava dezoito anos e faria parte do time; foi uma pena ele não ter saído nesta foto. Nesta época nós éramos pilotos garotões e sonhadores, e não nos dávamos conta da valia do nosso trabalho para a história do automóvel e do automobilismo brasileiro. A Europa era o auge; correr lá, nem pensar. Vivíamos distantes num mundo diferente, sem referências para avaliar nossa capacidade, que era bem alta. Tanto que o inimaginável aconteceu: cinco daqueles sete pilotos alguns anos mais tarde estariam na Europa, e três deles participariam do Campeonato Mundial de Fórmula 1. O Emerson foi duas vezes campeão mundial, perdemos o José Carlos Pace a caminho de mais títulos, e para o Wilsinho sobrou competência e faltou sorte. O Luizinho Pereira Bueno e o Chico Lameirão também fizeram bonito por lá. Dos sete, só eu e Carol Figueiredo não tivemos a coragem e disposição deles. Visando atender às aspirações do mercado brasileiro, a Willys se envolve no projeto M, a fabricação de um carro médio (daí “M”) utilizando a mecânica Renault que incluía a nova geração de motor de cinco mancais, iniciada com o 956 cm³ do Renault 8, de 1966. Ao mesmo tempo, a fábrica constrói três protótipos do novo Interlagos, o Alpine A-110, para promover nas pistas o futuro lançamento, que seriam os novos Interlagos berlineta propelidos pelo motor da nova geração, de 1.289 cm³ porém modificado com novo cabeçote de câmaras hemisféricas e que desenvolvia 130 cv. Dois amarelos com a faixa verde eram para competição e o terceiro azul marinho, com o interior de couro cor de vinho, para o presidente William Max Pierce.
Dois Gordini aliviadíssimos segundo o conceito carretera, que pesavam cerca de 600 kg, receberam a nova mecânica e ficaram muito competitivos, com quase o dobro da potência anterior. Além disso, vieram da França dois R-8 Gordini de competição completos. Era uma nova fase da Equipe Willys, que se atualizava para se defender da concorrência, que no início era bem-preparada: Chambord e Abarths da Equipe Simca, GT Malzoni (com motor DKW), Equipe Jolly com Alfa Romeo Giulia e Zagato e logo depois GTAm 2000, Equipe Dacon com os Karmann-Ghia-Porsche 2.000 cm³ quatro comandos, Equipe Cebem com os BMW 2.000 cm³. Eu e o Luiz Pereira Bueno permanecemos como os pilotos efetivos da equipe e nunca enfrentamos moleza. Embora com motor de menor cilindrada que a concorrência, nossos carros eram fantásticos e sempre alcançávamos bons resultados. Foi memorável quando a Equipe Palma europeia veio ao Brasil com dois Lotus 47 MkII, um novo Porsche 911 e um Ford Cortina para participar da Mil Milhas em Interlagos e da prova Almirante Tamandaré em Jacarepaguá no Rio de Janeiro, ambas em 1967. Nessa Mil Milhas fizemos dobradinha, Luiz Pereira Bueno e Luiz Fernando Terra Schmidt venceram com o Alpine 21, eu e Marivaldo Fernandes chegamos em segundo com o 22. Teve muita valia para nós, pois com um Alpine Renault 1300-cm³, brasileiro, vencemos por duas vezes seguida uma equipe europeia que trouxe quatro carros, além dos Alfas GTAm, Fitti-Porsche, todos 2000-cm³. Logo depois em Jacarepaguá, debaixo de muita chuva, venci com o Alpine 22.
Pouco tempo depois surge o Bino, fantástico carro construído no Departamento de Competição da Willys, que foi a obra-prima do construtor Toni Bianco e certamente o carro que mais venceu corridas no Brasil, tendo sido pilotado por José Carlos Pace, Lian Duarte, Antônio Carlos “Totó” Porto Filho e eu, mas, principalmente, por Luiz Pereira Bueno, que com este carro se consagrou e foi um dos maiores colecionadores de vitórias do Brasil. Neste período que enfrentávamos a concorrência nas pistas do Brasil contra os carros importados, e se consolidava o novo lançamento do Projeto M com motor Renault de cinco mancais e 1.289 cm³, a Ford absorvia a Willys-Overland do Brasil. No ano seguinte, em 1968, era lançado o Corcel e, atendendo às mudanças do automobilismo através dos tempos, o Departamento de Competição da Willys se desdobrava na firma de Luiz Antônio Greco, a Bino, que atuava com preparação e comercialização de equipamentos esportivos para o Corcel. Continuaria de forma terceirizada, recebendo apoio das fábricas para competição.
Pouco tempo atrás, na solenidade em que o Emerson deu aquela volta histórica com o Lotus 72 na marginal do Rio Pinheiros, estávamos reunidos e conversando eu, Emerson Fittipaldi, Reginaldo Leme, Alex Dias Ribeiro, Wilson Fittipaldi Júnior, Lian Duarte e meu filho Bruno, e o assunto navegava nas memórias daquele período de nossas vidas, das aventuras que vivíamos desfrutando o romantismo dos anos dourados, cujas lembranças se tornaram muito fortes. Foi quando, inspirado, perguntei ao Wilson: “Você que viveu tanto desde a fase do Brasil até o campeonato mundial, construiu o Fórmula 1…afinal qual foi a melhor época da sua vida?” Com a emoção momentânea ele se contraiu, seus olhos marejaram denunciando a emoção, e ele respondeu: “Foi na Willys, sem dúvida foi na Equipe Willys a melhor fase da minha vida.” O coração falou mais forte que a razão e todos, admirados, se emocionaram pela espontaneidade daquele sentimento. Ao longo do tempo dezenas de pilotos, de uma forma ou de outra, participaram da Equipe Willys e me permito incorporar o sentimento de todos manifestando minha imensurável gratidão à Renault pelos carros maravilhosos que valorizaram as nossas vidas e foram instrumentos importantes para a conquista do prestigio e da história do automóvel e do automobilismo brasileiro.